Roberto Lent, professor da UFRJ, na primeira reunião (RJ/2010) da Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia, lançou a seguinte indagação: Drogas: caso de polícia ou de saúde pública? Sem qualquer dúvida, afirmo: de ambas.
É caso de polícia considerando que, no Brasil, o tráfico de drogas domina quase todas as atividades criminosas, especialmente os crimes contra o patrimônio (furto, roubo, extorsão e seqüestro), atingindo praticamente todas as regiões povoadas do país. Em alguns locais o Estado sequer penetra, pois os traficantes não deixam, seja pela reação armada, seja em virtude dos altos níveis de corrupção de líderes sociais e até mesmo autoridades de segurança pública, que estabelecem a lei do silêncio. Uma verdadeira ameaça à democracia (ONU/2003). Em Cuiabá, 90% dos homicídios estão relacionados ao tráfico de drogas (DHPP/2009).
É uma questão de saúde pública, pois está comprovado, por inúmeros estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS), que o uso continuado de qualquer droga ilícita causa efeitos nocivos à saúde mental e física do usuário, além de transtornos emocionais (Cotrim & Carlini/1987 e Galduróz/1994). Isso significa dizer que as drogas ilícitas exigem, além de tratamento médico especializado, a adoção de políticas públicas de educação e prevenção, desenvolvidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Diria que também é um problema social. Só quem tem no seu meio familiar ou presencia o comportamento de um usuário de drogas sabe avaliar o mal que ele provoca, cotidianamente, a seus familiares, vizinhos e todos com quem convive. Por isso, acredito que todo indivíduo que deseja ser respeitado em seus direitos fundamentais (vida, liberdade, igualdade segurança, e propriedade), deve ver as drogas ilícitas como o principal vetor da violência, da desobediência civil e da criminalidade difusa e, em legítima defesa, combater seu comércio e uso sob qualquer pretexto.
A proliferação de drogas ilícitas no Estado já se tornou verdadeira endemia (Reinaldo Coutinho/HJM/2009).
Para alterar esse caótico quadro social, a Polícia Civil lançou e está executando o projeto "De cara limpa contra as drogas". Por sua vez, o governo estadual está implantando o PAS - Plano de Ação de Segurança -, que tem como principal alvo o combate às drogas ilícitas. As primeiras ações já motivaram a União Federal conceber, baseada no Gefron (Grupo Especial de Fronteira), a Pefron (Polícia Especial de Fronteira), para atuação organizada e efetiva contra o tráfico internacional.
Nesse compasso, o MPMT aprovou, em caráter permanente e prioritário, um Programa Antidrogas (Colégio de Procuradores/ julho/10), que visa, sistemática e continuadamente, promover ações judiciais e medidas administrativas de prevenção, tratamento adequado a dependentes e usuários, bem como de combate ao tráfico e ao uso de drogas ilícitas.
Fundamenta-se no trinômio prevenção-tratamento-repressão.
As metas consistem, especialmente, em: priorizar ações penais e cautelares que registrem tráfico ou consumo de drogas; fomentar ações governamentais e atos normativos, nos níveis estadual e municipal; elaborar e executar um plano de ação anual de repressão às drogas ilícitas, mediante diagnóstico de inteligência compartilhado com as polícias Federal, Rodoviária Federal, Civil e Militar; articular a participação dos Conselhos Municipais de Segurança Pública, dos Conselhos Tutelares, das Escolas públicas e privadas; firmar termos de cooperação e convênios para execução do programa.
Sua resolutividade pressupõe parcerias institucionais com os órgãos de segurança e saúde do Estado de Mato Grosso, objetivando desde a criação e o funcionamento de unidades de saúde que atendam ao usuário e ao dependente de drogas ilícitas, de delegacias especializadas de repressão às drogas no interior, especialmente nos polos de Rondonópolis, Cáceres, e Sinop, até a criação de um serviço ou agência estadual de inteligência antidrogas.
O programa pretende mostrar ao Judiciário a necessidade de se criar mecanismos que identificam os usuários-traficantes envolvidos com o comércio, em seu sentido amplo, de pequenas quantias de drogas (tráfico formiguinha); articular, no âmbito do e.TJMT, a fixação de competência de uma das Câmaras Criminais para julgar recursos e habeas corpus envolvendo traficantes e usuários-traficantes, inclusive para os plantões judiciários. Mas não é só. Almeja criar o Fundo Estadual Antidrogas, para receber recursos do Fundo Nacional Antidrogas, oriundos de conversões pecuniárias decorrentes de transações penais, de valores decorrentes da perda de dinheiro e bens apreendidos, que foram utilizados no tráfico de drogas ou adquiridos para sua prática, especialmente veículos, embarcações e aeronaves.
Que esse programa - Todos contra as drogas ilícitas - seja um vetor de transformação social, faça parte da rotina permanente de promotores e procuradores de Justiça, a bem das famílias mato-grossenses, e possa reduzir a criminalidade difusa, evitar o consumo de drogas ilícitas e assegurar tratamento digno e eficaz às suas vítimas.
Marcos Henrique Machado é promotor de Justiça e professor de Direito Público na Universidade de Cuiabá (Iune). E-mail: marhen@terra.com.br
Fonte: Gazeta Digital/ABEAD(Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas)
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